E EIS QUE, TENDO DEUS DESCANSADO NO SÉTIMO DIA, OS POETAS CONTINUARAM A OBRA DO CRIADOR.
(MÁRIO QUINTANA)

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

EU

EU
FLORBELA ESPANCA

Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do sonho, e desta sorte
Sou a crucificada... a dolorida...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber por quê...

Sou talvez a visão que alguém sonhou.
Alguém que veio ao mundo pra me ver
E que nunca na vida me encontrou

FLORBELA ESPANCA

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

EM CIMA DA MINHA MESA

EM CIMA DA MINHA MESA
José Régio
Em cima da minha mesa,
Da minha mesa de estudo,
Mesa da minha tristeza
Em que, de noite e de dia,
Rasgo as folhas, leio tudo
Destes livros em que estudo,
E me estudo
(Eu já me estudo)
E me estudo,
A mim,
Também,
Em cima da minha mesa,
Tenho o teu retrato, Mãe!

À cabeceira do leito,
Dentro dum lindo caixilho,
Tenho uma Nossa Senhora
Que venero a toda a hora...
Ai minha Nossa Senhora,
Que se parece contigo,
E que tem, ao peito,
Um filho
(O que é ainda mais estranho)
Que se parece comigo,
Num retratinho,
Que tenho,
De menino pequenino...!
No fundo da minha mala,
Mesmo lá no fundo, a um canto
Não lhes vá tocar alguém,
(Quem as lesse, o que entendia?
Só riria
Do que nos comove a nós...)
Já tenho três maços, Mãe,
Das cartas que tu me escreves
Desde que saí de casa...
Três maços – e nada leves! –
Atados com um retrós...

Se não fora eu ter-te assim,
A toda a hora,
Sempre à beirinha de mim,
(Sei agora
Que isto de a gente ser grande
Não é como se nos pinta...)
Mãe!, já teria morrido,
Ou já teria fugido,
Ou já teria bebido
Algum tinteiro de tinta!

IN "As Encruzilhadas de Deus"
José Régio

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

ECONOMIA

ECONOMIA

Giuseppe Artidoro Ghiaroni

“Dá de ti. Dá de ti quanto puderes:
o talento, a energia, o coração.

Dá de ti para os homens e as mulheres
como as árvores dão e as fontes dão.

Não somente os sapatos que não queres
e a capa que não usas no verão.

Darás tudo o que fores e tiveres:
o talento, a energia, o coração.

Darás sem refletir, sem ser notado,
de modo que ninguém diga obrigado
nem te deva dinheiro ou gratidão.

E com que espanto notarás, um dia,
que viveste fazendo economia
de talento, energia e coração!”...


Giuseppe Artidoro Ghiaroni


Nasceu em Paraíba Do Sul, (RJ), no dia 22 de fevereiro de 1919.
Depois de ter sido ferreiro, "office-boy" e caixeiro, passou a redator do "Suplemento juvenil " iniciando-se assim no jornalismo de onde passou para a Rádio distinguindo-se como cronista e novelista.
Faleceu no Rio de Janeiro, em 21 de fevereiro de 2008.
Publicou três livros de poesia

domingo, 1 de fevereiro de 2009

CHUVA


CHUVA


A chuva cai.
Violenta, fustigada pelo vento,
Traz consigo as impurezas
Que o Homem,
laboriosamente,
Vai acumulando no infinito azul.

Vendo-a, através das vidraças,
Ouvindo o seu cantar feito de lágrimas,
Pergunto-me :
Quem chorará deste modo ?

Será o céu, em desespero,
Ao ver do Homem a ignomínia,
o mesmo que ultrapassa
todas as barreiras,
e o desvenda,
Em total desrespeito pela sua intimidade ?

Não há lágrimas bastantes
Para um desgosto assim…

Só um dilúvio lhe poria fim !

Mariazita



Lisboa. Abrill 1997